ESTELIONATO
INTELECTUAL E FANATISMO POLÍTICO: As fake news e as ameaças à Democracia.
“O fanatismo é a única forma de
força de vontade acessível aos fracos.”
Nietzsche.
O
estelionato intelectual combinado com o fanatismo político alcançou o
paroxismo. Sites oportunistas e vigaristas espalham notícias falsas, as chamadas fake news (eles vivem
disso), e os fanáticos compartilham sem ao menos verificar a autenticidade das
informações (o fanático não precisa ver para crer). O fanático é aquele sujeito
crédulo, que ama ou odeia cegamente, embora acredite ter visão privilegiada, e
vê tudo sob o prisma estreito do maniqueísmo. O fanático se manifesta no plano
das certezas e se relaciona com a política como se fosse religião. São
autoritários, usam linguagem agressiva, intimidam, e nunca colocam sua fé
(política) em julgamento. Quando o fanatismo passa a ser alimentado por
estelionatários intelectuais, na velocidade da internet, a “coisa” pode assumir
proporções perigosas.
Li
ontem num desses sites pilantras, identificado como horadasnoticias.com, a seguinte “notícia”: “Maduro Ameaça Invadir o Brasil se Dilma Cair c/os Protestos,
compartilhe comente p/ + pessoas saberem”. É isso mesmo, e escrito desta
maneira. Logo abaixo do título, sem nenhuma explicação ou apresentação, aparece
um vídeo com um discurso de Nicolás Maduro no qual supostamente a “ameaça”
teria sido feita. Assisti ao vídeo e em nenhum momento o presidente Venezuelano
menciona qualquer tipo de ameaça de invasão, ainda que velada, ao Brasil (Assim
operam os estelionatários intelectuais). Acompanhado de militares, o que é
rotineiro num estado militarizado como é a Venezuela, Maduro parabeniza Dilma e
celebra a vitória de um “governo progressista” na América.
Suponhamos
que Maduro tivesse, sei lá, fora do juízo, feito a “ameaça”, o que seria
bastante grave. Ora, quem acompanha as peripécias do herdeiro de Chávez, e tem
um mínimo de discernimento, sabe que o sujeito é o campeão das bravatas e dos gestos
inconsequentes. E a “ameaça”, se tivesse sido feita, não passaria disso, de uma
bravata. Deduzir de uma declaração infeliz (que não foi dada) de uma figura
autoritária e folclórica como Maduro uma trama de esquerda para enredar o
Brasil nas malhas do bolivarianismo, como se tem feito, é, além de pilantragem
política, um desses delírios que o fanatismo provoca. Mas o que esperar de
pessoas que formam sua visão política se informando no submundo inescrupuloso
do jornalismo? Se não sabem distinguir uma boa fonte de informação, seja da
tendência política que for, e se não se preocupam em verificar a autenticidade
das notícias que compartilham, como conseguiriam ter algum discernimento
político?
Para
os vigaristas, que plantam estas notícias falsas, e os fanáticos, que as espalham
como se fosse o novo evangelho, não importa se o conteúdo é ou não é
verdadeiro. O que importa é o efeito deletério sobre o adversário. Para
derrubar o PT vale tudo. É o método deles, e neste sentido são pares siameses daquela
fração inescrupulosa de petistas que eles tanto odeiam.
A
difusão de noticias falsas, como a da suposta invasão do Brasil pelos chavistas,
embaladas por teses fantasiosas e vigaristas, originou as hiperbólicas bobagens
sobre a venezuelização e cubanização do Brasil, que chegou ao cúmulo com o
ridículo pedido de ajuda – a tal da “petição” contra a “expansão comunista”- encaminhado
ao presidente Obama por fanáticos antipetistas (Passei duas décadas incomodado
com o autoritarismo e o fanatismo petista. Quem diria que agora o que me
incomoda é o fanatismo contra o PT! Na verdade, estou me lixando para o PT.
Eles merecem. Minha preocupação é com a nossa democracia e com a tentativa de
desestabilização de um governo democraticamente eleito. O governo Dilma vai
além do PT. O PT? Bem, o PT, como diz o ditado, está colhendo o que plantou.
Que aprenda com tudo isso e se reinvente).
O
bolivarianismo, que eles sequer entendem, a cubanização e a venezuelização, são
os moinhos de vento dos setores autoritários e delirantes da “direita”
brasileira. A “esquerda” tem os seus moinhos de vento clássicos, mas os da “direita”,
se olharmos com uma boa dose de humor, são cômicos. A ameaça (inexistente) do
bolivarianismo e a importância que conferem ao (irrelevante) Foro de São Paulo,
visto como matriz ideológica de uma espécie de “pátria grande” comunista ou
bolivariana nas Américas, tornaram-se ideias fixas de alguns setores desta “coisa”
nebulosa e generalizante que chamamos de “direita” (Espero que as pessoas
sérias que se identificam com as ideias da “direita” não se sintam ofendidas).
Os mais exaltados e autoritários defendem uma intervenção militar, nos moldes
de 64, para salvar o Brasil do apocalipse comunista. Não adianta manda-los
estudar, ler livros de história. O problema parece ser cognitivo.
O
que dizer para esta gente:
-
Que o Foro de São Paulo, criado pela combinação de esforços do PT com o PC
cubano, num contexto marcado pelo desabamento do comunismo soviético e das
teses do “fim da história” de Fukuyama, doze anos antes do PT chegar ao
governo, surgia como importante e legítima alternativa, concordemos com ela ou
não, para pensar a integração regional e o desenvolvimento da América latina e
do Caribe, para além das proposições e orientações do Consenso de Washington? Era
um contraponto importante e necessário para uma América Latina que caminhava para
absolutismo de mercado e o “pensamento único”, expressão cunhada por Ignacio
Ramonet, em 1995. O Foro encarnava uma espécie de anti-consenso, fundamental
para pensar e propor alternativas aos ventos monetaristas que sopravam do norte.
Mas para quem vê no Foro apenas a tentativa de “implantação do comunismo na
América”, e se contenta com certos manuais e catecismos políticos que circulam
no ambiente virtual, fazer o que.
-
Que o Foro de São Paulo, hoje, além de inexpressivo e impotente, não passa de um
espaço obsoleto de discussão que reúne as esquerdas heterogêneas do continente,
com trajetórias diversas, que vão desde os partidos de centro-esquerda até os
grupos armados, e que esta diversidade paralisa as ações do Foro?
-
Que nas tais Atas do Foro, para quem está familiarizado com os debates no campo
da esquerda, não encontramos nada além das velhas teses sobre socialismo e
imperialismo afirmadas pelos grupos arcaicos e menos expressivos da esquerda
continental, e que o comunismo, que alguns grupos fanáticos pertencentes ao
Foro ainda defendem, não passa de uma teimosa crença racionalista que sobrevive
apenas no plano teórico dogmático (e na cabeça da direita fanática)?
-
Que as chances de o Brasil virar uma nova Cuba, ou de mergulharmos num processo
de venezuelização, são iguais, exercitemos a imaginação, a possibilidade de
avistarmos São Jorge na lua, montado num cavalo branco e fumando um charuto
cubano?
Não
levem estas bobagens sobre o Foro e a tal “venezuelização” tão a sério. Elas
emburrecem.
O
encontro do estelionato intelectual com o fanatismo político oferece uma boa
explicação para a foto abaixo. Imagino que os eleitores sérios e honestos do
Aécio, avessos aos messianismos, devem se sentir envergonhados.
“Do fanatismo à barbárie não há
mais do que um passo”.
Diderot.
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