O MARTÍRIO DE FIDEL
CASTRO EM NOME DA PAZ MUNDIAL: Lendo Uma Charge Hagiográfica.
Pronto. Fidel Castro
deu um passo decisivo em direção à canonização, à moda Guevara e Chávez, que certamente
o aguarda no futuro (que eu espero esteja ainda distante). O gesto humanista de
oferecer apoio/cooperação aos Estados Unidos e enviar médicos e enfermeiros aos
países africanos que lutam contra o ebola carimbou o seu passaporte passa os
domínios da santidade. Não faltarão dedicados hagiógrafos que comporão
formidáveis necrológios sobre a virtuosa e libertadora passagem do comandante
por este mundo. O gesto grandioso em direção à África, e a mão solidária
estendida ao inimigo histórico, certamente merecerão páginas laudatórias. A
charge acima não deixa dúvidas: enquanto o vizinho agressor mantém a ofensiva e
renova o famigerado “bloqueio”, o eterno comandante, atravessado por balas
imperialistas, estende compassivamente a mão oferecendo ajuda. Verdadeiro
martírio em nome da paz mundial e em socorro dos povos. Um novo mártir se ergue
nas Américas.
Eu corrigiria dois
detalhes na charge para dar-lhe um tom definitivamente hagiográfico: tiraria o
charuto, que não combina com o estado de saúde do comandante, nem com a
condição de santidade, e trocaria o uniforme militar pelos trajes da adidas
(trajes brancos). Os louros da vitória e as palmas do martírio, caídos aos pés
do mártir, sugestão de última hora, emprestariam mais gravidade à cena. O
ajuste dos detalhes evidenciaria ainda mais o contraste entre o homem que se
entrega em holocausto, em nome da solidariedade universal, e a agressividade do
império, o carrasco romano redivivo. A charge é a representação do calvário do
comandante.
A declaração de Fidel
Castro sobre a ajuda à África e a cooperação com os Estados Unidos apareceu num
artigo publicado no último dia 18 de outubro, no Gramna, órgão oficial do
regime, como antecipação aos temas a serem debatidos na “Cúpula Extraordinária da Aliança Bolivariana para os Povos da nossa
América-Tratado de Comércio dos Povos (ALBA-TCP)”, que aconteceu em Havana dois
dias depois. O combate rápido e eficiente à epidemia, segundo Fidel, deveria ser um dos
temas centrais do encontro. Como sempre, o discurso do oráculo de Havana pautou
e orientou o encontro da cúpula bolivariana.
A
ajuda cubana é pra lá de importante (mais de 160 médicos foram enviados para a
África ocidental). Tão importante que o secretário John Kerry declarou o
empenho de Cuba como “uma prova real de cidadania internacional”. As declarações de Margaret
Chan, diretora da Organização Mundial da Saúde, organização que coordena os
esforços globais para dar combate à epidemia, e de Ban Ki Moon, não deixam
dúvidas sobre o valor da ajuda cubana. A ajuda se torna mais importante ainda se olharmos da perspectiva dos povos que a estão
recebendo. Não duvido das boas intenções e, sobretudo, da sensibilidade e
capacidade dos médicos cubanos para lidar com a epidemia. Não questiono o gesto
cubano, legítimo e generoso. O que me incomoda é a reverberação das ações do
ditador aposentado entre os admiradores de plantão, sempre prontos para declarar
para o mundo a grandeza do homem e silenciar sobre seus erros. Basta um simples
gesto do comandante, e o dispositivo apologético, engatilhado há cinco décadas,
dispara rasgados elogios e celebra sua extraordinária visão. E Fidel? Bom,
Fidel apenas sendo o que ele sempre foi....Fidel! O homem preso dentro do
próprio mito.
Íntegra do artigo de
Fidel Castro Aqui: http://www.granma.cu/cumbre-extraordinaria-del-alba-tcp-sobre-el-ebola/2014-10-18/la-hora-del-deber
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