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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

UM BOM PATROCÍNIO AFIA QUALQUER CONVERSA.



UM BOM PATROCÍNIO AFIA QUALQUER CONVERSA.

A blogosfera abriu inúmeras possibilidades para franco-atiradores e mercenários virtuais.

Sabem aquele blog patrocinado pela Caixa Econômica Federal para defender o governo? O “Conversa Afiada”? Pois é. O manda chuva ali é o Paulo Henrique Amorim (PHA). Sim, ele mesmo. Não se lembram dele? Eu ajudo a lembrar. Trabalhou na Veja durante parte do regime militar, trabalhou na Globo, era governista na era FHC e atacava Lula e o PT e hoje é Lulista convicto e anti tucano aguerrido. Pois é. Este campeão da coerência, que usa a expressão PIG para se referir aos antigos patrões, esta em campanha para que Dilma assine a “Lei dos Meios”. Em duas postagens no seu blog sugere que Dilma esta fugindo do tema. Não creio. Não é fuga. Dilma parece não ter o mesmo interesse neste assunto como a maioria do PT e da esquerda brasileira tem. Mais de uma vez Dilma manifestou sua convicção de que a imprensa deve ser livre deste tipo de controle. O recado, para um bom entendedor, foi claro. Pode ser quer esteja enganado, mas acredito que no governo Dilma este tipo de tema não prospera.

Sugiro mudar o nome do blog do PHA para “Conversa Patrocinada”. Assim, toda vez que mudar o governo PHA não precisa criar um blog novo. Faz um acordo com a nova diretoria da CEF e continua sua missão governista. Missão, aliás, bastante lucrativa. De acordo com a assessoria de imprensa da CEF o blog recebeu 833, 28 mil referentes a 20 meses de veiculação de banners em 2011 e 2012. O “Conversa Afiada” recebeu também entre outubro e fevereiro de 2011 40 mil mensais reais dos Correios para promover uma campanha do Sedex (As informações da CEF sobre o patrocínio ao blog estão disponíveis no blog do Pannunzio). O sujeito parece conhecer bem o caminho das pedras para ganhar a vida adulando governos.

Como levar a sério a tal “Lei dos Meios” se quem a defende são homens como PHA, acusado diversas vezes de quebrar o código de ética do jornalismo e de violar o direito de informação? Da forma, e no contexto em que se pretende implantar uma regulamentação da mídia no Brasil, o que esta em jogo não é a democratização do acesso à informação. É um carteiraço político para calar a boca da imprensa inconveniente que faz dura oposição ao governo. É um acerto de contas do qual Dilma parece não querer fazer parte. 

Duvido que PHA recuse um convite para voltar a globo a frente de um telejornal. Ele não só aceitaria como imediatamente se tornaria o mais contundente crítico da “Lei dos Meios”. 

O oportunismo agora tem um blog oficial.

sábado, 29 de dezembro de 2012

O COMPLEXO DE SKYWALKER: O OFICIALISMO GROSSEIRO E GALOPANTE ACREDITA ESTAR VIVENDO NO UNIVERSO - white side e black side - DE STAR WARS.



O COMPLEXO DE SKYWALKER: O OFICIALISMO GROSSEIRO E GALOPANTE ACREDITA ESTAR VIVENDO NO UNIVERSO DE STAR WARS.


-  Ler ao som de Star Wars Theme Song (By John Williams).

- O texto foi inspirado em Raoul Girardet e George Lucas.

Em geral, entendem-se e explicam-se as ideias políticas como expressões do pensamento racionalmente organizado e logicamente conduzido herdado da primazia que se conferiu a razão no ocidente há pelo menos três séculos (Raoul Girardet). Resultou desta primazia conferida ao racional certa desconfiança em relação aos temas associados ao imaginário. Ainda que a terminologia tenha se imposto e faça parte do vocabulário acadêmico-científico, a noção de um imaginário político que se expressa por meio de mitos e alegorias ainda esbarra em vigorosa resistência. No entanto, como desconsiderar o apelo redentor presente nas revoluções? Como não levar em conta a simbologia do líder salvador? E o que dizer do tema da conspiração? Mito mobilizador por excelência, a temática da conspiração ou do complô é parte constitutiva de diversas experiências políticas do ocidente (complô jesuítico, complô judaico, complô maçônico). Da fase jacobina da revolução francesa ao terror stalinista o tema do complô desempenhou função tática para alimentar acusações e sustentar expurgos, visando livrar-se da ameaça, real ou não, de opositores. No cerne das grandes construções doutrinais dos séculos XVIII, XIX e XX, embora envolvidas por um caráter essencialmente científico, encontramos um forte apelo mítico. E é justamente neste aspecto, digamos menos científico, que repousa o poder de atração das grandes doutrinas políticas. O marxismo, expresso exclusivamente pelo seu componente conceitual e seu método analítico, teria chegado tão longe? Seria possível um marxismo sem o apelo profético e a visão messiânica? (Girardet) O componente mitológico é essencial para a compreensão da afirmação e do poder de mobilização de certas doutrinas políticas. 

Um discurso mitológico recorrentemente adaptado ao universo das lutas políticas é a batalha do bem contra o mal ou das forças da luz contra as forças das trevas. Diferentes manifestações políticas, em diferentes épocas, recorreram a este expediente como forma de desacreditar os oponentes ou apresentar-se como a única alternativa possível. 

No cinema a luta do bem contra o mal, desde o nascimento da sétima arte, esteve presente nos mais variados gêneros, do western ao terror. Mas foi talvez a saga Star Wars a expressão cinematográfica que retratou de maneira mais espetacular o confronto da luz contra as trevas. George Lucas recolheu componentes arquetípicos e mitológicos variados para compor a saga. Encontramos ali uma referência ao sábio mago Merlin (Obi-Wan Kenobi) aos Samurais do Japão feudal (Os Cavaleiros Jedi. Clinton Felker inspirou-se na cultura samurai para criar e desenhar alguns personagens), a trajetória do herói (Luke Skywalker) e uma referência central do Taoísmo (o Yin e Yang, a dualidade binária que mantém o universo em equilíbrio). 

No cinema o enfrentamento entre as duas forças oponentes e universais sempre rendeu grandes filmes. A epopeia O Senhor dos Anéis é a mais recente confirmação do poder de atração desse tipo de conflito. No campo da política é que a coisa fica complicada. No reino da ficção é perfeitamente admissível, quando não desejável. Ficar do lado do bem e torcer por Skywalker e Frodo é divertido, envolve certo conceito de justiça e, de quebra, garante a existência do universo. Tudo não passa de uma representação fílmica, ainda que possam, eventualmente, reportar-se a alguma realidade histórica. Mas na política? Como identificar o lado bom e o lado mau, a luz e as trevas, em termos de condução dos rumos do país, entre pessoas que vivem no mesmo plano existencial? Bem, isso é mais comum do que parece. Collor, em 1988, comportando-se como verdadeiro cavaleiro da luz, convocou as forças do bem para derrotar o mal que a esquerda representava naquele momento. Na visão da elite collorida, era o perfeito embate entre o ogro esquerdista, mutilado e supostamente ateu, e o elegante cavaleiro moralizante que prometia varrer do Brasil a corrupção e o fantasma do comunismo. Foi épico. E eu estava do lado do mal. O bem venceu, mas o país não foi salvo. O herói caiu em tentação e sucumbiu. As forças golpistas que destituíram o governo de João Goulart também julgavam representar o bem. O golpe de 1964 foi, na ótica dos seus idealizadores e simpatizantes, uma intervenção salvacionista. O lado do bem venceu, mas o país mergulhou nas trevas por vinte anos. Os exemplos poderiam facilmente ser multiplicados. 
 
Em momentos de crise de legitimidade, de mudanças significativas ou de ruptura com a ordem antes existente, este tipo apelo mítico é bastante recorrente. A crise atual que abalou moralmente a esquerda brasileira, particularmente o partido que comanda o governo, criou um ambiente propício para este tipo de manifestação. 

Configurou-se um tipo particular de oficialismo midiático de esquerda no Brasil, que atua principalmente na blogosfera, para contrapor à retórica dos grandes meios de comunicação. Um parêntese. Alguns amigos acham que eu bato demais na esquerda e muito pouco na direita. É verdade. O problema é que não tenho vontade nem saco para escrever sobre a direita. Eventualmente rabisco alguma coisa. Não tenho vontade porque acho a direita chata, enfadonha, e não creio que valha a pena. Além disso, quem esta governando o país é a esquerda com quem sempre mantive uma relação de proximidade e de desconfiança, de atração e de repulsa, de afinidade e de divergência. Nunca fomos grandes amigos, embora sempre tenhamos andado juntos. Será porque descobri Bakunin antes de Marx? Artaud antes de Lênin? Pasolini antes de Gramsci? Quem sabe. E se não valesse a pena, eu não escreveria sobre a esquerda. E ainda vale a pena? Acho que no fundo escrevo e escrevo para descobrir isso. Fim do parêntese.

O novo oficialismo, como que dotado de uma missão heróica, ataca a tudo e a todos que de alguma forma contestem os governos petistas de Lula e Dilma. A ortodoxia, ontem e hoje, não admite críticas. Autores como Marco Antônio Villa e Demétrio Magnoli, e mais recentemente Ferreira Gullar e João Ubaldo Ribeiro, são acusados de conspirar com a mídia conservadora contra os autoproclamados governos progressistas. Identificados como expressões intelectuais da direita são abusivamente xingados de ingênuos, conservadores, reacionários e portadores de um “ódio” de classe contra os governos ditos populares. No auge do delírio populista são acusados de serem contra o povo. Na visão simplista, maniqueísta e manipuladora da ortodoxia reinante, existem apenas dois lados: ou você esta com o governo petista ou esta do lado forças identificadas como conservadoras (Ou você esta do lado da luz ou do lado das trevas. Mas é bom lembrar à oficialidade de plantão que não estamos no mundo de Star Wars). Parece não haver outras possibilidades. Logo, ou Ferreira Gullar é ingênuo ou esta do lado da “mídia golpista”. Diversos blogs e portais, muitos dos quais financiados pelo governo ou por estatais, existem apenas para promover e defender o governo e contra-atacar a ofensiva da mídia liberal. São sucursais do governo financiados com o dinheiro público. Nestes ambientes governistas, Ferreira Gullar e João Ubaldo são os vilões da vez.

De acordo com a voz oficial, o objetivo precípuo das forças conservadoras é “inviabilizar o governo da presidenta Dilma Rousseff e destruir a imagem pública do ex-presidente Lula da Silva.” (A fonte é conhecida, não precisa citar). Estaríamos diante de um complô midiático? Neste caso, a função do complô seria explicativa e essencialmente mobilizadora. A ideia de um complô permite articular fatos e acontecimentos aparentemente dispersos e apresentá-los como se fizessem parte de uma lógica inflexível e presos a uma mesma causalidade. Como diria Girardet, o complô configura uma “chave interpretativa” que reúne o conjunto dos acontecimentos de modo a tornar perfeitamente visível e inteligível aquilo que se forma na sombra e ronda ameaçadoramente a ordem estabelecida. Identificado e desmascarado o complô, o passo seguinte é mobilizar forças para defender a ordem, o regime, o governo. Esta é a diferença entre (1) entender que os meios de comunicação liberais fazem dura oposição ao governo e não medem esforços para atacá-lo e desmoralizá-lo e (2) acusar a existência de um complô orquestrado e uníssono para destruir o governo, e acusar quem critica o governo de fazer parte do complô.

Se a finalidade da grande mídia é mesmo inviabilizar o governo Dilma (o que eu acho um tanto exagerado), o PT deveria estar acostumado. Fez isso a vida toda com seus adversários, sobretudo com Fernando Henrique Cardoso. Agora que esta no poder esperava o que? Complacência? O consenso em torno do messias do ABC? (Admiro, em parte, a figura do Lula. Votei nela minha vida toda. Reconheço o bom governo que fez. Mas às vezes a repulsa vem e toma conta. Só não me digam que essa repulsa tem a ver com preconceitos de classe, certo).

Mas o problema não é esse. O problema é a retórica e a narrativa épica de que se reveste a oficialidade governista. Reduz-se tudo a uma luta titânica do bem contra o mal como se estivéssemos vivendo uma epopeia cinematográfica de George Lucas. O lado sombrio da força, comandado por poderosos IMPÉRIOS de comunicação e por vilões terríveis como Azevedo, Noblat, entre outros, contra ataca para deter o avanço da luz e restituir os privilégios de outrora. A “elite” (que neste caso se resume aos donos dos meios de comunicação) não se conforma com os rumos (da luz) que o país esta tomando. Não admitem que a vez dos pobres tenha chegado e que um ex-operário tenha alcançado a presidência da república e governe para o povo. Onde já se viu isso! A versão tropical e direitista de Darth Vader (o império midiático) trouxe para as suas hostes nomes como Ferreira Gullar e João Ubaldo, que antes andavam no caminho da luz. Estão ouvindo a música tema de Star Wars? Ela é edificante, grandiosa. Ajuda a entender o espírito mitológico e messiânico que envolve a saga da esquerda no poder no Brasil. Mas é bom lembrar que o outro lado também faz uso do mesmo recurso. A revista Veja, Azevedo, Augusto Nunes e Noblat estão numa verdadeira cruzada ética e moral contra o que acreditam ser o perigo que o PT representa para a democracia brasileira. Não se trata de um complô ardilosa e organizadamente orquestrado para inviabilizar o governo Dilma. Trata-se de oposição sistemática e implacável. E quer saber, Dilma sabe muito lidar com isso. Lula não. Dilma parece entender os embates numa democracia, Lula prefere denunciar o complô.

É claro que nesta luta do lado da luz (jedi) contra o lado sombrio (sith), os deslizes dos cavaleiros jedis - educados pelo mago e mestre Lênin, que travam batalhas épicas no parlamento burguês e contra o terrível poder do dispositivo midiático - devem ser perdoados. Afinal, o que esta em jogo é o domínio do universo pelas trevas do capital. A mitologia jedi-leninista identifica a lógica do capital como a filosofia que orienta o lado sombrio da força. A derrota do governo da luz (que emana da estrela) pode representar o retorno do lado sombrio e a vitória definitiva do monstro que a tudo escraviza: o CAPITALISMO. 

Um trecho de um texto que tem circulado pelo ambiente virtual é suficiente para ilustrar minha argumentação:
“Agora, a nova cruzada moral recebe, além dos já conhecidos defensores dos “valores civilizatórios”, nomes como Ferreira Gullar e João Ubaldo Ribeiro. A raiva com que escrevem poderia ser canalizada para causas bem mais nobres se ambos não se deixassem cativar pelo canto da sereia. Eles assumiram a construção midiática do escândalo, e do que chamam de degenerescência moral, com o fato. E, porque estão convencidos de que o país está em perigo, de que o ex-presidente Lula é a encarnação do mal, e de que o PT deve ser extinguido para que o país sobreviva, reproduzem a retórica dos conglomerados de mídia com uma ingenuidade inconcebível para quem tanto nos inspirou com sua imaginação literária.”

Tive que ler e reler várias vezes para me convencer de que o sujeito estava de fato sustentando isso. Além da usual vitimização do PT, o texto expõe um conjunto de sofismas, claro, pretensamente esclarecedor sobre as intenções dos autores atacados. Para arrematar, o sujeito apela para a velha e conhecida tática de desqualificação: a ingenuidade. Ferreira e Ubaldo não têm autonomia intelectual. Eles simplesmente reproduzem, com espantosa ingenuidade, “a retórica dos conglomerados de mídia”. Com duas ou três frases – ou seriam palavras de ordem - o sujeito destroça a trajetória e a biografia de dois dos maiores intelectuais brasileiros. Enquanto Ferreira e Ubaldo limitavam-se a “imaginação literária”, estava tudo certo, mas quando se meteram a escrever sobre política e questionar sobre – imaginem! – as condutas morais de personalidades da esquerda e do PT, tornaram-se reprováveis. Luis Nassif referiu-se a Ferreira Gullar como um “melancólico comunista arrependido, a serviço das forças e interesses que sempre combateu em seus melhores anos.” O poeta, porque escreve crônicas para a Folha de São Paulo e crítica Lula e Chávez, está a serviço “das forças e interesses” conservadores. Nassif, Nassif. Antes de desqualificar o poeta desta maneira responda as acusações de que o seu site é financiado pela Caixa Econômica Federal, pela Petrobras e pelo Ministério da Saúde.  

O que deveria se esperar de intelectuais como eles, que sempre condenaram a corrupção e os desmandos da direita, diante da indigência moral que se abate sobre a esquerda? O silêncio cúmplice e pragmático? Atacar com mais força ainda a direita para tirar o foco e dirimir os estragos políticos dos escândalos da esquerda? As reações de Ferreira Gullar e de João Ubaldo Ribeiro foram condizentes com suas trajetórias. O texto “A hora da saideira”, do João Ubaldo, publicado no jornal O Globo, é de uma lucidez admirável. Destaco um fragmento do texto:

“O PT que nós conhecíamos, de princípios bem definidos e inabaláveis e de uma postura ética quase santimonial, constituindo uma identidade clara, acabou de desaparecer depois da primeira posse do ex-presidente. Hoje sua identidade é a mesma de qualquer dos outros partidos brasileiros, todos peças da mesma máquina pervertida, sem perfil ideológico ou programático, declamando objetivos vagos e fáceis, tais como “vamos cuidar da população carente”, “investiremos em saneamento básico e saúde”, “levaremos educação a todos os brasileiros” e outras banalidades genéricas, com as quais todo mundo concorda sem nem pensar.
No terreno prático, a luta não é pelo bem público, nem para efetivamente mudar coisa alguma, mas para chegar ao poder pelo poder, não importando se com isso se incorre em traição a ideais antes apregoados com fervor e se celebram acordos interesseiros e indecentes.”

Poderíamos classifica-lo como um traidor, ou um conservador alinhado com a grande mídia, por um texto como este? O que esperavam do Ubaldo? Uma apologia rasgada e pegajosa da figura do Lula? Esqueçam.

Claro que não vai faltar quem diga: “o Ubaldo escreveu para O Globo e o Ferreira deu entrevista para a Veja. Viu, eles estão juntos.” Nem deveria perder tempo com isso, mas não custa lembrar que Millôr Fernandes escreveu durante anos para a Veja. Começou na revista em 1968 e manteve intensa colaboração profissional com a Editora Abril. Paulo Henrique Amorin e Mino Carta também trabalharam na Veja. Mas na cabeça dos vigilantes do pensamento se você lê a veja ou escreveu alguma coisa lá, você é automaticamente associado com a linha de pensamento e com a postura política da revista. 

E o Ferreira Gullar? O que ele teria dito ou escrito de tão abominável para atrair atenção da patrulha? Vejamos a entrevista que deu a revista Veja:

“O Senhor se considera um direitista?
Eu, de direita? Era só o que faltava. A questão é muito clara. Quando ser de esquerda dava cadeia, ninguém era. Agora que dá prêmio, todo mundo é. Pensar isso a meu respeito não é honesto. Porque o que estou dizendo é que o socialismo acabou, estabeleceu ditaduras, não criou democracia em lugar algum e matou gente em quantidade. Isso tudo é verdade. Não estou inventando.
E Cuba?
Não posso defender um regime sob o qual eu não gostaria de viver. Não posso admirar um país do qual eu não possa sair na hora que quiser. Não dá para defender um regime em que não se possa publicar um livro sem pedir permissão ao governo. Apesar disso, há uma porção de intelectuais brasileiros que defendem Cuba, mas, obviamente, não querem viver lá de jeito nenhum. É difícil para as pessoas reconhecer que estavam erradas, que passaram a vida toda pregando uma coisa que nunca deu certo.
 Como o senhor define sua visão política?
Não acho que o capitalismo seja justo.
O capitalismo é uma fatalidade, não tem saída. Ele produz desigualdade e exploração. A natureza é injusta. A justiça é uma invenção humana. Um nasce inteligente e o outro burro. Um nasce inteligente, o outro aleijado. Quem quer corrigir essa injustiça somos nós. A capacidade criativa do capitalismo é fundamental para a sociedade se desenvolver, para a solução da desigualdade, porque é só a produção da riqueza que resolve isso. A função do estado é impedir que o capitalismo leve a exploração ao nível que ele quer levar.
Como o senhor avalia a perspectiva de condenação dos réus do mensalão?
O julgamento não vai alterar o curso da história brasileira de uma hora para a outra. Mas o que o Supremo está fazendo é muito importante. É uma coisa altamente positiva para a sociedade. Punir corruptos, pessoas que se aproveitaram de posições dentro do governo, é uma chama de esperança.”

Retomo.
Perceberam o ódio e a raiva na fala do poeta? Não? Nem eu. Podemos dizer que o poeta foi seduzido pelo “canto da sereia” midiática e reproduz ingenuamente sua retórica? Procurem a entrevista e leiam na íntegra. Vale a pena.

Já tinham lido a entrevista? Ah, você não lê a Veja. Sei. Tá bom. Mas critica, não é? Entendi.

Vamos adiante...

Este é o Ferreira Gullar que eu conheço. Rápido, ágil com as palavras, inteligente e honesto (Não posso defender um regime sob o qual eu não gostaria de viver). O Ferreira Gullar inventado pelo discurso oficial e instrumentalizado para servir de judas na blogosfera e nas redes sociais eu não reconheço. Pois é. Um homem como este, com uma trajetória identificada com a construção de um país mais justo e mais honesto, é tratado como um vendido, enquanto aqueles se envolveram em esquemas criminosos são tratados como heróis. Isto diz muito sobre os valores praticados pelos desqualificadores profissionais do poeta. É isso mesmo. Uma pá de cronistas e blogueiros tornaram-se profissionais a serviço do governo, a soldo ou não, cuja missão oficial é farejar e desacreditar os críticos e associá-los ao que chamam de “dispositivo midiático conservador”. Não foi apenas a prática política de parcela da esquerda que se corrompeu. A capacidade de destruir levianamente reputações e de atribuir sentimentos e ideais aos seus adversários, que não correspondem à realidade, tornou-se uma especialidade da oficialidade. É a difamação como missão.
Vou denominar a autoimagem desta esquerda, que acredita representar o bem e a verdade, e de que vive numa eterna batalha épica contra as forças do mal, de Complexo de Skywalker. O “andarilho dos céus” da saga de George Lucas é a representação futurista, arquetípica e intergaláctica do herói clássico que realiza uma missão cujos propósitos elevados estão além do entendimento das pessoas comuns. A patologia é grave, sobretudo nos danos morais que provoca nas vítimas daqueles que sofrem do Complexo. Os cavaleiros do bem não medem esforços para revelar aos leitores comuns as terríveis tramas e conspirações que as forças do mal articulam para desestabilizar o lado luminoso.
Estou exagerando? Estou. O exagero, e as analogias com a ficção, são formas de chamar a atenção para as arbitrariedades, as grosseiras simplificações e a má fé dos discursos que poluem a blogosfera e as redes sociais. Às vezes é preciso carregar nas tintas.

Antes de aderir ao jogo rasteiro da política partidária e de transformar Ferreira Gullar num vilão direitista que se deixou “cativar pelo canto da sereia” conservadora, recomendo ler os seus poemas e conhecer sua inconfundível biografia. 

Termino com um poema do Ferreira que traduz a complexidade do ser e do pensar, que não pode ser reduzida pela luta político-partidária infame num jogo indecente entre o Lulo-petismo e o resto. 

TRADUZIR-SE
Uma parte de mim é todo mundo:
outra parte é ninguém: fundo sem fundo.
uma parte de mim é multidão:
outra parte estranheza e solidão.
Uma parte de mim pesa, pondera: outra parte delira
Uma parte de mim é permanente: outra parte se sabe de repente
Uma parte de mim é só vertigem: outra parte, linguagem
Traduzir-se uma parte na outra parte – que é uma questão de vida ou morte – será arte?

(Ferreira Gullar).

Para encerrar. 

Ferreira Gullar era comunista, foi crítico do stalinismo, mas abandonou o antigo credo. Mudou. E é cobrado por isso. A expressão pejorativa “ex-comunista arrependido” já diz tudo. Parece que virou um traidor da “causa”. O poeta virou um apóstata. Niemeyer, que sempre foi stalinista, é louvado e celebrado por ter se mantido a vida toda fiel ao comunismo e ao stalinismo. O poeta é detonado porque mudou, o arquiteto é glorificado porque não mudou. Ajudem-me a entender. Quem aqui é o conservador? O que deixou o que não deu certo para trás e mudou ou o que se apegou cegamente ao que não deu certo e nunca mudou? Minha intenção não é sacrificar o arquiteto para reabilitar o poeta. Gosto dos dois. Niemeyer não mudou? Para mim tudo bem. Mas declaro minhas simpatias ao poeta que se livrou de um peso morto do passado e se abriu para a vertigem do presente.

Paulo.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

ESTÔMAGO DE URUBU – PARTE II



ESTÔMAGO DE URUBU – PARTE II



Dando sequência aquele textinho sobre “estômago de urubu”, da semana passada, aí vai um arremate.
Um amigo comentou, num papo sobre o julgamento do mensalão: “...mas Paulo, o dito mensalão não parece ser fruto de uma manipulação midiática?” A pergunta era retórica, e a resposta foi mais ou menos a seguinte:

Em parte, é sim. Claro. A superexposição do caso e a exploração que a TV (Globo), certas revistas (Veja) e jornais (O Globo, Folha de São Paulo) fazem do esquema político denunciado pelo gângster Roberto Jeferson, não deixam dúvidas. Pretendem fazer do mensalão – expressão cunhada na Folha de São Paulo - o caso mais emblemático da corrupção brasileira e transformar o julgamento no “julgamento do século”, uma espécie de inquisição política para desmoralizar o PT. As forças políticas e sociais de oposição ao governo Lula/Dilma fazem do mensalão um oásis no meio do deserto político em que se encontram. Incapazes de mobilizar demandas sociais em torno de um projeto alternativo, incapazes de unificar minimamente uma frente de oposição e de forjar uma liderança nacional que faça frente ao Lulismo, se apegam ao caso do mensalão como último recurso para quebrar o poder político petista. Espera-se que a condenação de alguns dos nomes mais importantes da história do partido abale a reputação e a estrutura política construída na última década.
Existe uma mistificação do caso promovida por setores da imprensa. Mas isso não quer dizer que o dito mensalão não tenha ocorrido. Vamos em frente.

O discurso da vitimização não pode ser levado a sério. PRIMEIRO, o PT fez isso a vida toda. Quando na oposição, empunhou o bastião da moralidade e se especializou na “arte” da desmoralização público dos inimigos políticos. Agora, O PARTIDO está na posição vulnerável em que antes se encontravam seus adversários. Não porque é vítima de uma conspiração conservadora, mas porque cometeu os mesmos “pecados” que outrora denunciava. SEGUNDO, a exploração sensacionalista que as forças de oposição fazem do mensalão não pode nos tornar surdos para o que está gritando diante de nós. As evidências de um poderoso esquema de compra de votos, comandado por José Dirceu e Marcos Valério, o operador do esquema, são avassaladoras, e os envolvidos nunca apresentaram nada que pudesse por em dúvida as denúncias de Jeferson e as provas da existência do esquema apresentadas no relatório final da Polícia Federal. O máximo que fizeram foi negar as denúncias e acusar uma conspiração midiática. Mas isso todos eles fazem ou fizeram, não é. Demóstenes se declara vítima de uma perseguição. Marconi Perillo, cada vez mais enredado, se declara vítima do PT, por ter desafiado Lula. A tática é sempre a mesma, o que muda é o enredo e a legenda. Os “companheiros” se revelaram tão indiferentes à democracia e a coisa pública quanto seus adversários históricos. Então porque tratá-los de maneira diferenciada? Merecem um julgamento e, caso a culpa se confirme, cadeia. Ou os “pecados” da esquerda tem outro peso, outra medida? Será que os “companheiros” erram tentando acertar? Será que o fazem em nome do bem comum? Não creio. Fazem pelo partido, por si próprios, pelo desejo de permanência do poder e pelo desprezo que cultivam pela democracia representativa (burguesa demais para o igualitarismo – que rima com totalitarismo - da esquerda). Consideram-se iluminados e portadores da chave da história. Os instrumentos e o modus faciendi da democracia se apresentam como obstáculos às suas certezas históricas. Herança imaterial e autoritária do leninismo combinado à arrogância quase fascista da cultura sindical. Descobri lá nos remotos anos 80 que era impossível argumentar com Eles. Nenhuma novidade. Historicamente a esquerda nunca foi democrática (Os anarquistas da Ucrania, liderados por Nestor Makhno entre 1917 e 1921, que o digam). 

Primeira digressão: Evitei usar as palavras “elite” e “burguesia” para designar os grupos que fazem oposição ao PT, como geralmente se faz, por dos motivos: O termo elite é tão genérico que define tudo e não define nada. O termo é generalizante e homogeneíza falsamente setores diferentes que, por diferentes motivos, fazem oposição ao PT. Elite por elite, se formos nos ater nos significados e na etimologia, a esquerda também se configura como uma elite, intelectual e política. Em alguns casos, os companheiros passaram a fazer parte de uma elite fundiária e econômica. Burguesia é um termo ainda mais complicado, e que sobrevive apenas na sintaxe binária e retrógrada de grupos e de intelectuais de certa esquerda. Burgueses todos nós somos. E se quiserem insistir na guerra das classes, e na falsa dicotomia burguesia X trabalhadores, eu poderia identificar, inspirado no repertório ocidental das classes, uma verdadeira aristocracia de esquerda, sobretudo partidária, que parasita o lombo de uma classe operária por eles imaginada e idealizada. Sim, o trabalhador, o operário, é um tipo idealizado, um herói romanesco que habita os delírios teóricos da esquerda e confere legitimidade as suas ações. Os trabalhadores reais, de carne e osso, são aqueles que pagam, contra a sua vontade, a contribuição sindical obrigatória. Esta aristocracia não nobiliárquica tomou gosto por belos ternos, vinhos caros, motoristas particulares, uma corte de bajuladores, constituiu patrimônios fabulosos e, embora mantendo a retórica socialista e um apelo quase mítico às classes trabalhadoras, se comporta como verdadeira aristocracia operária. 

Pois bem, os autodenominados “representantes dos trabalhadores” acusam a mídia, “representante dos interesses das elites”, de manipulação da opinião pública. O mensalão nunca existiu. Foi uma criação midiática, um lance de marketing das grandes corporações que dominam a comunicação no Brasil, para conspirar contra os governos de Lula e de Dilma. A designação genérica “mídia” é identificada com uma sigla que define sua natureza: PIG (Partido da Imprensa Golpista).
A mídia liberal no Brasil é acusada também de encobrir os casos de desvio da conduta pública dos seus aliados e de dar ampla cobertura jornalística aos casos envolvendo a esquerda. O caso Demóstenes é um bom exemplo. A Veja foi cobrada e acusada de silenciar sobre o caso. Em parte isto é verdade. Em parte. Mas a esquerda não faz o mesmo? O PT silencia quando se trata dos seus, como faz o PSDB.  Esquerda e direita (ou o que restou delas) protegem os seus e demonizam os adversários. Alguém já leu na Carta Maior algum artigo crítico sobre escândalos de corrupção envolvendo nomes da esquerda? Não. Ao contrário. José Dirceu recebeu várias vezes espaço no Portal para se defender das acusações. Os articulistas de Carta Maior ou silenciam ou defendem os companheiros envolvidos nos escândalos políticos. Com exceção da autocrítica da esquerda, no que diz respeito à corrupção, realizada de tempos em tempos por Tarso Genro, o que predomina é o silêncio. Neste ponto, acredito que Veja seja menos parcial que Carta Maior. O caso Demóstenes e o caso Arruda, por exemplo, receberam cobertura jornalística da Veja, os casos envolvendo petistas foram e continuam sendo ignorados por Carta Maior. Gostaria de ouvir uma boa explicação para isso.
Culpar a mídia, e acusar algum tipo de manipulação conservadora para desestabilizar o governo, tornou-se uma fórmula manjada, mas muito usada, para NÃO explicar os escândalos envolvendo personalidades da esquerda. A “mídia neoliberal”, de acordo com esta versão dos acontecimentos, cria fatos políticos artificialmente, forja escândalos e usa de expedientes condenáveis, para manter privilégios de uma “classe” (ou para manter o povo na ignorância, gritam os mais exaltados) e frear as mudanças idealizadas pelo governo progressista em foco, a exemplo do que aconteceu em 1964. Esta é, por exemplo, a tese de Emir Sader sobre o mensalão, publicada no portal Carta Maior. Ele não discute as evidências. Se esquiva. Apenas nega a existência do esquema, com um jogo retórico manjado, e denuncia um golpe de marketing orquestrado contra o governo de esquerda de Lula. No auge do delírio militante aponta os governos de Jango e Getúlio como de esquerda. Porque faz isso? Para poder sustentar que na história do Brasil sempre se tentou impedir que governos de esquerda concluíssem seus mandatos. “O que é isso Companheiro?” 

O qualificativo “udenista”, na novilíngua governista, traduz bem a visão predominante nos círculos de esquerda sobre a mídia. Supõe-se que a tal mídia representa antigos interesses de classe arraigados em nossa sociedade (Não discordo totalmente disso, mas também não generalizo). Com base neste axioma, traçam uma linha de continuidade que atravessa obstinadamente os tempos, alheia as mudanças: a mídia é a mesma ontem, hoje e sempre, e representa os mesmos interesses que dominavam no passado. “Udenismo” não é apenas força de expressão, ou algum tipo de analogia histórica. Não. É uma percepção histórica mesmo (a-histórica, eu diria). É uma associação direta, quase metafísica, do passado com o presente, que assinala uma marca indisfarçável da continuidade dos interesses conservadores brasileiros (Emir Sader faz isso muito bem). O udenismo golpista dos dias de hoje foi consagrado com a sigla PIG. Pretende-se com isto sustentar a ideia de que existe de fato uma conspiração de direita, articulada pela mídia, para enfraquecer o governo. Logo, quaisquer formas de crítica e de oposição aos governos de esquerda são vistos como conspiração. Quem não sabe lidar com oposição vê conspiração em tudo. Será que por trás disso existe um fundo psicanalítico ligado a figura do pai? Deixa pra lá: se entrar nesta vereda serei obrigado a sustentar que a teoria virou esquizofrenia.  Voltando. É bom lembrar que o “mito da conspiração” tem um enorme poder de mobilização. Foi usado em diferentes momentos, pela esquerda e pela direita, para legitimar expurgos e livrar-se de inimigos indesejáveis.  Na Venezuela, recentemente, foi agenciado pelo chavismo para atacar e fechar canais de televisão. De acordo com o “mito”, forças adversas tramam nas sombras intermináveis complôs. A “mídia”, na América Latina, é este vale de sombras onde se refugiam os seres esquivos que lançam toda sorte de injúrias contra “governos progressistas” (eu diria messiânicos). É claro que os meios de comunicação, particularmente na América Latina, se comportam como verdadeiros partidos políticos. Mas daí a ver nisso uma eterna conspiração conservadora, ou é paranoia ou é uma tática de mobilização dos espíritos voluntariosos. O efeito imediato do apelo à “conspiração” é inocentar a priori as personalidades ou partidos de esquerda, alvo destas críticas e denúncias (O caso do ministro da cultura, do PCdoB, é um bom exemplo disso). A sigla PIG foi criada por Paulo Henrique Amorin. Este sujeito é um prodígio moral e um exemplo de oportunismo político. Nos primeiros anos da ditadura militar, trabalhava na Veja, ao lado de Mino Carta, que era redator chefe. A Veja, na época, apoiava o regime militar e dedicava textos elogiosos à intervenção política dos militares. Os editoriais da revista falavam da legitimidade da “revolução”, que livraria o Brasil da ameaça comunista (Tenho os exemplares da revista, daqueles anos, e acabei de consultá-los para escrever este texto). Amorin, que também trabalhou na Globo, era Tucano confesso, ao longo dos dois mandatos de FHC, e notório anti-petista. Hoje, ele ataca FHC e vestiu de vez a camisa do Lulismo (É um daqueles recém-conversos). Pois é, foi este prodígio do jornalismo governista que inventou a sigla PIG, largamente usada na blogosfera governista e por simpatizantes da esquerda. PHA, valendo-me da economia das siglas, é um daqueles recém-conversos. O negócio deste sujeito é estar com quem governa. É um governista nato. Para não me estender demais, não vou tratar das siglas JEG e BESTA, igualmente infelizes. Uma coisa é certa.  Nesta guerra das siglas – letras isoladas que identificam palavras - quem sai perdendo são as palavras, ou a capacidade de com elas expressar ideias. Opera-se uma abreviatura das ideias para leitores interrompidos.

Por um lado, culpar a mídia de oposição por todos os infortúnios do governo e da esquerda é não querer enfrentar os problemas de frente e reconhecer os deslizes dos “companheiros”. Por outro, negar as tentativas de manipulação por parte de setores da mídia ou negar o caráter político do julgamento do mensalão, é ingenuidade. O negócio é manter uma distância segura disso tudo para que o comprometimento demasiado com um dos lados não altere nossa percepção ética e moral das coisas. Não é porque os governos do PT elevaram o Brasil a um novo patamar internacional (um global player) e alcançaram índices sociais importantes (para dizer o mínimo), que vamos fazer vistas grossas aos abusos cometidos. Os bons resultados políticos, econômicos e sociais dos governos petistas não tiveram correspondência no plano moral. Devemos silenciar decorosamente em nome dos acertos do governo? Postura semelhante transformou a ilha de Fidel num paraíso social. As pessoas não tem liberdade para sair de lá e só podem ler o Granma, o jornal oficial do Comitê Central do Partido Comunista Cubano, fundado em 1965. A liberdade de expressão e de ir e vir são limitadíssimas, mas a saúde e a educação são de graça e de boa qualidade, embora só seja permitido ensinar com base no materialismo histórico nas universidades. Se o povo cubano tem acesso à educação e saúde de graça, de que importa o totalitarismo do Estado e a vontade quase absoluta do ditador? Mas tem uma coisa sobre a qual o partido não tem muito controle em Cuba: a internet. Ela é precária, mas faz um estrago!!! Os blogs cubanos são os canais preferenciais de denúncia das arbitrariedades do governo e da falta de liberdade. A blogosfera é a nova Sierra Maestra cubana. É de deste espaço incorpóreo – e por isso quase inalcançável pela ditadura – que parte dos cubanos diz ao mundo o que pensa da prisão caribenha. 

Segunda digressão: o uso corrente e ideologizado do conceito de mídia acabou por vulgarizá-lo. Mídia, no vocabulário governista, é uma entidade genérica que materializa forças atávicas de um passado elitista, subserviente e entreguista, deixadas para trás na última década. Daí a necessidade de regulamentar e de domesticar estas forças para que não voltem a fazer do Brasil um banquete neocolonial. Uau! Acreditem, eu escuto esse blá blá blá, este marxismo a la Marta Harnecker, há mais de 30 anos.  E me pergunto: não aprenderam nada com o fascismo??? Perdeu-se toda criticidade? A reflexão foi substituída por slogans e palavras de ordem domesticadas. Este conceito vazio de mídia só serve para mistificadores e populistas aventureiros que querem fazer do mundo – ou da América latina – o seu laboratório de experimentos sociais redentores. Isso sempre acaba em algum tipo precário e previsível de autoritarismo esculhambado, à custa do povo que se pretendia “libertar”.
Este texto não é um manifesto anti-esquerdista. Não acho que a esquerda valha hoje um manifesto. É um ponto de vista, apenas. E se escrevo contrariando algum ponto de vista da esquerda é porque considero que a direita realmente não vale a pena. Nunca valeu. A esquerda também, faz tempo, não tem valido a pena. Quer saber, não do à mínima para nenhum dos lados. Escrevo tão somente pelo gosto do debate (não da polêmica), contra o conformismo, contra o consenso, e pela defesa de certos princípios. Frei Beto diria que estou sendo financiado pela CIA. (como fez com Yoani Sanchez) ou que sou leitor inocente da Veja. Calma. Não me considero tão importante assim a ponto do Frei Beto prestar atenção em mim. Mas eu presto atenção no que ele escreve. E confesso não gostar dos escritos do guia espiritual dos companheiros materialistas. Foi este bravo defensor dos diretos humanos quem escreveu que em Cuba não existiam presos políticos, mesmo eles estando em greve de fome, e que José Rainha, líder do MST, era preso político no Brasil. Foi visitar Rainha na prisão e levou um caloroso abraço do presidente Lula. Ué, mas ele não era preso político? 

Esse é Frei Beto. E querem saber o que ele pensa do mensalão? Adivinhem.

Tchau.