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quarta-feira, 16 de novembro de 2016

O DIVINO GUARDIÃO DA FONTE DE ÁGUA DOCE.

O DIVINO GUARDIÃO DA FONTE DE ÁGUA DOCE.


São oito horas da noite e lá está ele, impassível e elegante, vigiando o bebedouro com água doce. Apelidei o bichinho de “tesoura”. É um beija-flor com rabo de tesoura (conhecido popularmente como beija-flor tesoura ou tesourão). De longe parece ser todo preto, mas de perto, se conseguirmos encurtar a distância, podemos observar tons de verde escuro e branco.

Os beija-flores são territorialistas e defendem energicamente as reservas de néctar na natureza, ou os bebedouros de água com açúcar que usamos para atraí-los. O “tesoura” é um dos mais brigões da espécie. Esse que pousou para foto, se alojou na minha árvore (ou na árvore dele) e não permite que outros beija-flores e pássaros menores que ele se aproximem do bebedouro. As disputas são ferozes. Os outros beija-flores, menores e de cores variadas, frequentam a disputada fonte nos horários em que o “tesoura” não está na área. Instalei dois bebedouros para ver se as coisas se acalmavam. Que nada. O “tesoura” se posicionou no ponto equidistante entre os dois. Bebe nos dois e bota o resto da turma pra correr. Às vezes, mesmo com chuva, ele fica de vigia, naquela mesma ponta de galho. Quando percebe a presença dos “invasores”, emite um som inconfundível, se arma para a briga e parte decidido para cima dos “penetras bons de bico”. Depois volta majestoso para o galho. Não sem antes voar ao redor da fonte e conferir se está tudo em ordem. A cena se repete várias vezes durante o dia. “Tesoura” é incansável na defesa do seu território!

Os bebedouros também são frequentados pelas cambacicas (popularmente conhecidos como “sebinhos”), pássaros pequeninos, espertos e destemidos, com tons predominantes de amarelo, combinados com o marrom e o branco, que aparecem em turmas de quatro ou cinco para bebericar o drink adocicado. Diferentemente dos beija-flores, que aparecem em certas horas do dia, os “sebinhos” já estão esperando, de manhã cedo, quando subo na escada para trocar a água e colocar o bebedouro na árvore, e só vão embora à noitinha.  Adoram a água doce (o néctar) e se banham com ela, jogando-a em todas as direções. Quando eles estão no bebedouro, melhor não ficar embaixo. Quando estão em turma, “tesoura” fica irritado, abre as penas da cauda na forma de um leque, troca de galho para manifestar o descontentamento, emite aquele som inconfundível, mas não toma nenhuma atitude. Mas quando algum “sebinho” atrevido chega sozinho, a ferinha avança e espanta o intruso. Às vezes, mesmo sozinho, o bichinho não se intimida com os voos ameaçadores do beija-flor. Finge que não é com ele e fica ali, se deliciando no bebedouro.

Quando a noite cai, e eu deixo de propósito o bebedouro na árvore, é a vez dos morcegos. Eles saem de não sei onde, em bandos, e bebem a água toda em menos de uma hora. São sete ou oito morcegos, uma verdadeira colônia, que só param de beber quando o bebedouro seca. Eles não se intimidam com a nossa presença. Dão voos rasantes, intimidadores, entram na edícula, e se lançam sobre a fonte de água. Acho que o “tesoura” não sabe dos invasores noturnos.

O nome científico da ferinha, fixado em 1778, é Eupetomena macroura (Do grego, Eu = divindade e Petomena = sempre sustentado pelas asas. E makros = longo; ouros = rabo). Os nomes científicos são engraçados. São pomposos e parecem não corresponder ao ser que pretendem definir. No caso do beija-flor tesoura, o nome parece muito apropriado. É uma pequena divindade alada, veloz e colorida, com cauda longa e furcada, que guarda zelosamente a valiosa fonte de água doce.





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