Pin it

domingo, 28 de outubro de 2018

USTRA IS THE NEW BLACK


USTRA IS THE NEW BLACK



É impressionante como em determinadas conjunções políticas perde-se completamente o senso de decência, de humanidade e ultrapassa-se perigosamente os limites do que é moralmente aceitável.  Em tempos assim, o grotesco sai dos cantos escuros e ganha o centro do palco e monstros são cultuados como heróis nacionais.

Você usaria uma camiseta com o rosto de um criminoso julgado e condenado? Existem limites éticos para a moda, para o vestir-se?

A moda não é apenas funcional e não se limita a proteger e vestir o corpo. É uma linguagem, um constructo social e cultural que projeta valores e afirma identidades individuais e/ou coletivas. É uma forma de estarmos e nos expressarmos no mundo. Nossas roupas dizem muito sobre quem nós somos.
O vermelho saiu de moda na política nacional. Desbotou, perdeu o brilho e foi engolido pela onda conservadora que varre as ruas e domina as correntes de WhatsApp. Estão em alta agora as tonalidades marciais e bélicas de verde e amarelo, que também marcaram as tendências em 1964 e em 1989.

A moda da próxima estação vai aos poucos se delineando. A família Bolsonaro é quem está ditando as tendências. O estilo é mais primitivo, autoritário, truculento, deselegante mesmo. Promete banir das ruas as camisetas com estampas do Che Guevara. Na guerra das camisetas, travada na political catwalk, autoritarismo se combate com mais autoritarismo (“Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria”, disse o Messias da costura “sem ideologia”).

Eduardo Bolsonaro, o deputado mais votado da história do Brasil, exibe orgulhoso a camiseta em homenagem ao coronel Brilhante Ustra. Vestindo um modelo básico,  estival e intimidador, o modelo apresenta uma tendência retrô, que resgata um passado sinistro e obscuro que, na versão prêt-à-porter bolsonariana, é anunciado como NOVO e RENOVADOR.

A moda promete revolucionar o guarda-roupa das “pessoas de bem”, das famílias e salvaguardar a inocência das crianças. Nada da porcaria afeminada, imposta pela “ideologia de gênero”, lançada por costureiros gays europeus (O gênero também saiu de moda!). A nova tendência da moda bolsonariana busca inspiração no DOI-Codi e no DOPS, exemplos de masculinidade hétero patriótica para fazer, de uma vez por todas, a moda virar à direita, nem que seja no pau-de-arara, na linha dura de Ustra, o estilista da tortura (Ustra foi condenado em 2008 pelo crime de tortura e teve a sentença confirmada em 2012. Bolsonaro o reabilitou na votação do impeachment em 2016. De lá para cá, o coronel foi transformado num ícone da moda política anti-esquerdista). 

Será que a moda vai pegar? Ou vai ser como aquela NOVA tendência lançada em 1989, que não chegou a terminar a estação? A maioria dos brasileiros vestiu a camiseta do “caçador de marajás”, os políticos pegavam carona na onda CoLLorida e todos entoavam em coro: eLLe é o  NOVO, é o NOVO. Menos de dois anos depois o novo havia se tornado muito velho. O preto ganhou as ruas e o CoLLorido saiu de moda. Foi nessa época que o jovem Messias se elegeu deputado e começou a costurar uma dinastia, de corte e estilo inconfundíveis.

Enfim, as semelhanças chamam a atenção, embora o estilo atual seja mais agressivo e militaresco.

Seja como for, passageira ou não, a ditadura está na moda e a tortura (visual) está de volta.



A ideia Brilhante de estampar o rosto do torturador nas roupas foi da marca Camisetas Opressoras, que as apresenta no seu site como “camisetas divertidas e personalizadas de direita”, moda “inspirada no Grande coronel Ustra”. A loja está lucrando com o terror, com a covardia e com o que de pior o nosso país já produziu (Tenho certeza que a direita democrática se sente horrorizada com o mal gosto das estampas opressoras).

Para os estilistas da Opressão tudo não passa de uma brincadeira divertida e lucrativa, que afirma uma identidade política. Para mim não. Minha consultora sobre a estética fascista e a moda totalitária, Hannah Arendt, diria que se trata, mais uma vez, da “banalização do mal”. Estamos de tal modo anestesiados pela violência que alguns grupos passaram a vesti-la. E vesti-la significa estimulá-la e praticá-la simbolicamente. O que poderia ser visto, num primeiro momento, como um protesto bem-humorado da turma que se identifica como “de direita”, é, na verdade, a mais completa trivialização da violência. A “banalidade do mal” é expressão do vazio de pensamento e da perda de sensibilidade. O terror virou moda!

Vamos ver até quando os valentões fashion e os opressores descolados vão vestir a camiseta do herói deles.

O catálogo da “moda opressora” é sortido e atende à todas as estações. Abaixo, os modelos de camisetas e moletons nas mais variadas cores e estilos. Vai do básico do dia-a-dia ao modelo patriótico-militar, recomendado para eventos cívicos e desfiles do sete de setembro, que ao que tudo indica voltarão a ser obrigatórios nas escolas (Escolas que, dependendo da vontade do Messias, adotarão um estilo e uma disciplina militar). Tem Ustra para todos os gostos.










Aprendam a diferença entre discordância de posições políticas e fanatismo político e a diferença entre democracia e apologia da tortura e nós voltamos a conversar.

Diga-me o que vestes que te direis quem és.


2 comentários: