A FILHA DO DITADOR
VOTOU NÃO: MARIELA CASTRO QUEBROU A UNANIMIDADE HISTÓRICA DA ASSEMBLEIA CUBANA (SÓ
QUE NÃO).
A notícia de que pela
primeira vez em 40 anos um deputado discordou de uma lei em Cuba chegou ao
Brasil com seis meses de atraso. O caso ocorreu em dezembro passado. A deputada
Mariela Castro, filha de Raúl Castro, sobrinha de Fidel, e diretora do CENESEX, o Centro Nacional de Educação Sexual,
posicionou-se contra a novo código trabalhista que proibia a discriminação no
trabalho com base em gênero, etnia e orientação sexual. A deputada considerou que a lei não evitava a
discriminação contra pessoas com HIV e com identidades de gênero não
convencionais. "Eu não poderia votar a favor, sem a
certeza de que os direitos trabalhistas das pessoas com identidade de gênero
diferente seria explicitamente reconhecido", disse Mariela numa entrevista
no blog de Francisco Rodriguez, ativista gay e pró-regime. A intervenção da
deputada foi, do meu ponto de vista, corretíssima. Apoiado! Mas cá entre nós, o
tema apreciado pela Assembleia estava longe de ser um daqueles “calcanhares de
Aquiles” políticos do regime. E todos sabem em Cuba que a deputada CASTRO é a
maestra que comanda o show quando o assunto é gênero, orientação sexual e temas
a fins. Ousadia política de verdade seria um deputado de fora do clã se levantar
e questionar a posição da sobrinha do comandante.
A Assembleia
Nacional cubana, composta por 612 deputados, reúne-se duas vezes por ano para
aprovar leis. Nas últimas décadas as votações foram sempre unânimes (Daqui a
pouco aparece alguém dizendo que a unanimidade é sinal de que o povo cubano, através
da Assembleia Nacional, manifesta apoio incondicional ao regime). Mariela
Castro, a filha do homem que herdou o comando da ilha por linhagem familiar, foi
a primeira a quebrar a unanimidade histórica. A notícia correu o mundo e a
atitude da deputada foi, por muitos, considerada revolucionária. Será? Se o
voto contrário tivesse partido de um deputado qualquer, sem laços sanguíneos
com o comando do regime, eu concordaria que alguma coisa está acontecendo por
lá. Mas Mariela? Ela é a voz oficial do regime na área da sexualidade. Viaja
com regularidade aos Estados Unidos e ninguém a acusa de simpatizar com os ianques.
Declarou numa entrevista que votaria em Obama, elogiou o posicionamento do
presidente americano a favor do casamento gay, e nenhum órgão oficial a
censurou. A deputada CASTRO goza de privilégios, organiza passeatas oficias
pelas ruas de Havana em defesa da causa LGTB e não é perturbada pela vigilância
política. Sua atuação e militância conferem uma falsa ideia de participação e
liberdade de expressão (O regime agradece). No entanto, a deputada, que luta
pelo direito dos gays, não se manifesta em relação à discriminação política e a
posição oficial de Cuba no plano internacional sobre orientação sexual. Em 2013
a delegação cubana nas Nações Unidas votou junto com outras 77 delegações que consideram
a homossexualidade um “delito” em suas legislações, sendo que em cinco delas o “crime”
é punido com pena de morte. A posição de Cuba da ONU contraria a decisão do
partido comunista de 2012 que, num congresso extraordinário, concordou em
acabar com qualquer tipo e discriminação na ilha. A CENESEX silenciou diante da
postura oficial de Cuba. Nenhuma nota, nenhum pronunciamento do Centro, nem de
sua presidente.
O
não de Mariela na Assembleia Nacional soa quase como um capricho da filha do ditador.
Ao invés de celebrar o primeiro voto de desacordo, prefiro lembrar os silêncios
e as omissões da deputada CASTRO. Acredito que a “luta” de Mariela contra a
discriminação sexual é importante, mas não podemos esquecer que ela fala de
dentro do regime, da varanda da mansão dos Castro.
Observadas
todas as ressalvas, Mariela Castro lembra Marina Silva: fala do “novo”, anuncia
a “nova política”, e anda de braços com o que de mais velho e viciado existe na
política nacional.
Na
foto, lá em cima, Mariela desfila a causa contra a homofobia pelas ruas de Havana.
Ao fundo, a imagem do herói nacional que foi, em vida, um dos mais agressivos
perseguidores dos gays no processo de construção do socialismo em Cuba.
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